sexta-feira, 22 de março de 2013

Para presidente do CFM, há "hipocrisia social" em relação ao aborto

Saúde pública

Para presidente do CFM, há "hipocrisia social" em relação ao aborto

Segundo ele, as mulheres com condições financeiras têm recorrido a métodos seguros, enquanto as mais pobres acabam se submetendo a métodos alternativos que podem colocar em risco a própria vidaO presidente do CFM, Roberto D’Ávila

Marcela Mattos, de Brasília
O presidente do Conselho Federal de Medicina, Roberto D' Ávila, justificou a decisão de apoiar o aborto até a 12ª semana de gestação sob o argumento de que há, no Brasil, uma "hipocrisia social" em relação à interrupção da gravidez. Segundo ele, as mulheres com condições financeiras têm recorrido a métodos seguros, enquanto as mais pobres acabam se submetendo a meios alternativos que podem colocar em risco a própria vida.
"Esse é o retrato de uma grande hipocrisia social. Filhas de médicos, juízes e advogados vão fazer a interrupção de forma segura e muitas vezes com médicos e aparelhos específicos. Já a mulher pobre não tem acesso. Ela faz em condições inadequadas, inseguras, usa doses erradas de medicamentos e fazem a manipulação do útero e enriquece as estatísticas horrorosas da saúde pública, nas quais o aborto é a quinta causa da mortalidade", justificou D' Ávila, acrescentando que essa desigualdade é inaceitável do ponto de vista médico.
Atualmente, a legislação prevê a interrupção de gravidez em casos de risco à saúde da mãe, estupro ou fetos anencéfalos. Até o início da próxima semana, o CFM enviará um documento ao Senado, que atualmente estuda a reforma no Código Penal, para sugerir que o aborto deve depender unicamente da vontade da mulher.
"Vamos continuar defendendo sempre a vida. A vida é o bem maior e supremo. Mas entendemos que do ponto de vista bioético, o princípio da autonomia tem sido a tônica desse corpo de conselheiros", disse o presidente. Ele reforçou que o aborto, desde sempre, é uma prática entre as mulheres. A diferença é o suporte encontrado, o que, para ele, vira um caso de saúde pública. "As mulheres decidem interromper a gravidez. Hoje, ontem, sempre elas vão decidir." O médico salienta que há o entendimento de que se está correndo o risco de ser enquadrado em um crime, mas que a mulher opta pela interrupção por ser, para ela, uma redução de danos.
O limite para estabelecer o aborto até a 12ª semana está justificado no fato de que, depois desse período, aumentam os riscos para a mãe, tendo em vista que o útero encontra-se maior e com a parede mais fina. O CFM argumenta ainda que a partir dessa idade gestacional o sistema nervoso do embrião já estaria completo, o que poderia permitir ao feto ter a possibilidade de "neuroticamente ser agredido e perceber essa violência."
Tomando como exemplos casos de países que legalizaram o aborto, o presidente do CFM afirmou que a medida não servirá como incentivo para as mulheres deixarem de se prevenir e recorrerem ao método. Ele reforça que, nos locais onde há a liberação, as estatísticas não demonstram aumento na quantidade de interrupções. "E nós não podemos esquecer a questão da orientação. A prática não pode ser vista como um método contraceptivo", ressaltou.
Resistência — A decisão do CFM encontrou resistência dentro dos conselhos regionais. De acordo com Roberto D' Ávila, foi criada uma comissão formada por 15 juristas para estudar o tema. Após diversas discussões internas, iniciadas no ano passado, 80% dos conselhos votaram a favor da medida. "Quero deixar claro que os conselhos, em nenhum momento, aprovaram a total liberação do aborto. Não se trata disso. Essa decisão pertence à sociedade, através do Congresso Nacional", argumentou. O presidente espera encontrar resistência também entre os parlamentares e representantes de grupos religiosos.

Nenhum comentário:

Postar um comentário